O equilíbrio corporal é fundamental no relacionamento espacial do homem com o ambiente. É uma complexa interação entre os sistemas sensorial e o motor que previne quedas e fornece o equilíbrio. Porém, quando ocorre uma alteração em um de seus componentes, como o proprioceptivo surgem alterações que caracterizam o desequilíbrio e que podem, inclusive afetar a qualidade de vida do indivíduo. Portanto, se a propriocepção está alterada ou diminuída, o equilíbrio também ficará alterado (GANANÇA, 1998).
Atualmente, um terço da população adulta dos Estados Unidos é considerada idosa (mais de 65 anos), o que implica num maior risco de quedas. Com os mais de 35 milhões de idosos nos Estados Unidos, a taxa de quedas é de mais de 10 milhões por ano (ROGERS, 2003).
As quedas representam uma causa significante de ferimentos, além de serem as principais causas de mortes em idosos, resultados da inabilidade e dos cuidados com a saúde. O risco de quedas também se relaciona com a propriocepção, já que a presença de instabilidade deve-se a oscilação postural (DELISA e GANS, 2002).
Em 2000, ocorreram 1,8 milhão quedas nos EUA que resultaram em traumatismos cranianos, ferimentos de tecido mole, luxações e fraturas (incluindo 340.000 quadris fraturados), resultando em um custo de 16.4 bilhões de dólares em medicina direta (ROGERS, 2003).
Uma série de fatores contribui para as quedas; dentre eles se destacam: os efeitos de doenças e remédios; fatores ambientais, tais como pisos escorregadios e iluminação insuficiente; muitos fatores físicos, incluindo a fraqueza muscular e falta de equilíbrio (ROGERS, 2003).
No Brasil os idosos correspondem a 8,6% da população total do país, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com base no Censo 2000. Além dos idosos, pessoas que sofrem lesões em algum dos componentes proprioceptivos terão perda de equilíbrio e estarão sujeitas a quedas. Visto que a sensibilidade da posição e movimento de uma articulação provém da informação originada nos músculos, cápsulas articulares, ligamentos e pele, lesões dessas estruturas podem afetar a propriocepção (DELISA e GANS, 2002). Quando há lesão ligamentar, os receptores proprioceptivos ficam danificados o que compromete a aferência sensitiva que baseia a realização dos movimentos (LIANZA, 2001).
A sensibilidade proprioceptiva na reabilitação, após lesões, é extremamente relevante. A importância de melhorar a propriocepção pela reabilitação é demonstrada pelo risco significativamente maior de sofrer uma nova lesão em indivíduos com alterações proprioceptivas quando comparados com indivíduos com índices proprioceptivos normais. O retorno bem-sucedido às AVDs após uma lesão ligamentar parece ser até mesmo mais dependente da propriocepção que da tensão ligamentar da articulação (DELISA e GANS, 2002).
O treinamento proprioceptivo tem papel importante no tratamento das lesões ligamentares. Nessas lesões parece haver uma interrupção no mecanismo de feedback mecânico, o que aparentemente se restabelecem parcialmente com a reabilitação, tanto no tratamento conservador como no tratamento cirúrgico (PAPLER et al., 1999).
A melhora da propriocepção do joelho com a reabilitação pode ser obtida através da utilização de uma bandagem elástica, vibrações tendíneas e técnicas de visualização de imagens mentais do movimento. Isso deve ser realizado associado à reprogramação neuromotora sobre planos instáveis e junto a um programa de fortalecimento específico para obter uma reprogramação “neuroproprioceptiva” (KERKOUR; SALGADO, 2003).
O homem possui um sentido que o permite conhecer a inclinação de seu corpo, assim como também possui a capacidade de reajustá-lo e de corrigir todo desvio em relação à vertical (GAGEY e WEBER, 2000). A habilidade para manter o centro de gravidade sobre a base de apoio, geralmente quando se está em pé é denominada equilíbrio.
Esse é um fenômeno dinâmico que envolve uma combinação de estabilidade e mobilidade. O equilíbrio é necessário para manter uma posição no espaço ou movimentar-se de modo controlado e coordenado (KISNER e COLBY,1998).Ellenbecker (2002) define equilíbrio de três formas: a capacidade de manter uma posição, a capacidade de movimentar-se voluntariamente e a capacidade de reagir a uma perturbação.
Carr (2003) coloca o equilíbrio como sendo a capacidade de neutralizar forças que poderiam perturbar seu estado, o que requer coordenação e controle. Hall (2000) acredita que a estabilidade corporal tem a ver com o estado de equilíbrio do corpo, a resistência à aceleração angular ou linear e a capacidade do indivíduo em assumir e manter uma determinada posição refere-se ao equilíbrio corporal do sujeito.
O equilíbrio é um resultado de ações dinâmicas e está relacionado à capacidade de manter a linha que passa pelo centro de gravidade, perpendicular ao solo e dentro de uma base de apoio (BARCELLOS e IMBIRIBA, 2002). Duarte (2001) concorda que a tarefa do sistema de controle postural é manter a projeção horizontal do centro de gravidade (CG) do indivíduo dentro da base de suporte definida pela área da base dos pés durante a postura ereta estática.
A postura ereta, estática e dinâmica resulta do equilíbrio entre as forças que agem no centro de gravidade, e as forças dos grupos musculares antigravitacionais que se contraem e atuam em sentido contrário (LIANZA, 2001). A questão do equilíbrio, bem como toda a complexidade envolvida na obtenção e manutenção deste, é notada quando se assume a posição ereta. O fato de manter o equilíbrio torna-se extremamente difícil quando a capacidade de manter a postura ereta se deteriora (DUARTE, 2000).
A complexa função do equilíbrio só é possível através da integração de várias estruturas como: o sistema motor (força muscular, tônus muscular, reflexos tônicos de postura); as sensibilidades proprioceptivas (que informam ao sistema nervoso central a posição dos segmentos corpóreos e dos movimentos do corpo); o aparelho vestibular (cujos receptores informam a posição e os movimentos da cabeça); o sentido da visão (encarregado da percepção das relações espaciais) (SANVITO, 2002). Essas estruturas atuam de forma complexa, integrada, redundante e de maneira diferenciada para cada perturbação sobre o corpo humano. As propriedades passivas do sistema músculo-esquelético, principalmente a rigidez das estruturas biológicas, também desempenham um importante papel na manutenção do equilíbrio (DUARTE, 2001).
Fatores como peso corporal, base de sustentação, organização do esqueleto ósseo, resistência viscoelástica dos elementos musculares e ligamentares, e reflexos posturais também estão envolvidos na manutenção do equilíbrio postural (BARCELLOS e IMBIRIBA, 2002).
O equilíbrio se subdivide em duas modalidades:
Refere-se à capacidade do indivíduo em manter uma posição antigravitacional estável quando em repouso, por manter o centro de massa dentro da base de apoio disponível (ELLENBECKER, 2002). A estabilidade é alcançada gerando-se momentos de força sobre as articulações do corpo para neutralizar o efeito da gravidade ou qualquer outra perturbação em um processo contínuo e dinâmico durante a permanência em determinada postura (DUARTE, 2001).O equilíbrio estático é garantido quando o somatório de todas as forças atuantes no corpo, verticais e horizontais, é igual a zero (FRONTEIRA, DAWSON e SLOVIK, 2001).
A postura estática é descrita como sendo o equilíbrio do organismo do homem na posição parada (em pé, sentado ou parado) em situação que não cause nenhum dano das estruturas anatômicas responsáveis por tal, e não produza dor quando essa posição for mantida durante muito tempo (FILHO, 2001).
É difícil encontrar exemplos nos esportes ou tarefas motoras diárias em que o equilíbrio estático esteja presente. Ao assumir a posição ereta bípede, o corpo humano permanece em constante equilíbrio dinâmico (DUARTE, 2000). A postura ereta não é um evento estático, sendo caracterizada por oscilações, mantendo o corpo em contínuo movimento. Essas oscilações são de ordem involuntária e dependem de mecanismos neuromusculares, visando preservar o equilíbrio postural (BARCELLOS e IMBIRIBA, 2002).
O conceito de equilíbrio dinâmico é aplicado a corpos em movimento, a uma velocidade constante seja angular ou linear; ele está entre as forças que estão sendo aplicadas no corpo (HALL, 2000). A existência do equilíbrio dinâmico humano depende do controle motor, o qual é auxiliado pelos sistemas sensoriais presentes no organismo (FERREIRA, 2003).
O equilíbrio dinâmico envolve respostas posturais automáticas ao deslocamento da posição do centro de massa. Respostas posturais reativas são ativadas para recapturar a estabilidade quando uma força inesperada desloca o centro de massa (DUARTE, 2000).
A postura dinâmica participa na realização de todos os movimentos de deslocamento do corpo, sendo então descrita como o equilíbrio adequado na realização dos movimentos que devem ser executados sem dor. Na posição adequada de equilíbrio, as vértebras, os discos, as articulações e os músculos executam essa função com o mínimo de desgaste (FILHO, 2001).
MECANISMOS DE POSTURA E EQUILÍBRIO
Essas funções se fazem basicamente pelo arquicerebelo e pela zona medial, que promovem a contração adequada dos músculos axiais e proximais dos membros, de modo a manter o equilíbrio e a postura normal, mesmo nas condições em que o corpo se desloca. A influência do cerebelo é transmitida aos neurônios motores pelos tractos vestíbulo-espinhal e retículo-espinhal. A aferência articular é transmitida para a medula e centros do tronco cerebral pelas vias ascendentes de fibras da raiz dorsal (fascículos grácil e cuneiforme).O fascículo grácil conduz impulsos provenientes dos membros inferiores e da metade inferior do tronco; o fascículo cuneiforme conduz impulsos originados nos membros superiores e na metade superior do tronco (MACHADO, 2005).
A atividade da fibra aferente articular também ajuda as fibras aferentes do fuso muscular na inibição da atividade muscular antagonista sob condições de perturbação posturais não esperadas. Quando um impulso surge dos receptores cutâneos, articulares, musculares e vestibulares simultaneamente, é gerado uma aferência, e ajustes posturais involuntários agem para estabilizar e levar o centro de gravidade do corpo para um estado de equilíbrio (GOULD, 1993).
A propriocepção é um termo utilizado para descrever todas as informações neurais originadas nos proprioceptores das articulações, músculos, tendões, cápsulas e ligamentos, que são enviadas através de vias aferentes ao sistema nervoso central (SNC), de modo consciente ou inconsciente, sobre as relações biomecânicas dos tecidos articulares, as quais podem influenciar o tônus muscular, programas de execução motora e coordenação, cinestesia, reflexos musculares, equilíbrio postural e estabilidade articular (BACARIN et al., 2004).
§ RECEPTORES PROPRIOCEPTIVOS
Existem seis tipos de receptores proprioceptivos classificados de acordo com o estímulo que os ativa, são os seguintes:
1. quimiorreceptores – são receptores sensíveis a estímulos químicos, como os da olfação e gustação.
2. osmorreceptores – receptores capazes de detectar variação de pressão osmótica.
3. fotorreceptores – receptores sensíveis a luz,como os cones e bastonetes da retina.
4. termorreceptores – receptores capazes de detectar frio e calor.São terminações nervosas livres.
5. nociceptores – são receptores ativados em situações em que há lesões de tecido, causando dor.São terminações nervosas livres.
6. mecanorreceptores – são receptores sensíveis a estímulos mecânicos e constituem o grupo mais diversificado (MACHADO, 2005).
Os proprioceptores são receptores mecânicos, também chamados de mecanorreceptores, que são sensibilizados durante a deformação articular, levando informações sobre a angulação e velocidade do movimento ao sistema nervoso central. (BACARIN et al., 2004).
Os impulsos nervosos originados nesses receptores podem ser conscientes ou inconscientes. Os inconscientes não despertam sensação, sendo utilizados pelo SNC para regular a atividade muscular através do arco reflexo simples ou dos vários centros envolvidos na atividade motora, em especial o cerebelo. Os impulsos proprioceptivos conscientes atingem o córtex cerebral e permitem ao indivíduo ter percepção corporal (noção espacial, atividade muscular e movimento articular), sendo responsáveis pelo sentido de posição e de cinestesia (MACHADO, 2005).
Os estímulos mecânicos são convertidos pelos proprioceptores em atividade elétrica, direcionando-os aos elementos neurais das vias aferentes no SNC, o qual irá processar e modular respostas motoras em seus centros de forma consciente ou inconsciente (BACARIN et al., 2004). Os receptores musculares são a fonte predominante das informações proprioceptivas, mas os receptores cutâneos e articulares também contribuem para os processos que envolvem a percepção (COHEN, 2001).
PROPRIOCEPÇÃO NO EQUILÍBRIO
A palavra propriocepção refere-se aos processos sensoriais envolvidos na consciência da postura e do movimento. O sistema proprioceptivo tem seu foco em três variáveis: a percepção da posição, do movimento e da força do membro (COHEN, 2001). A propriocepção descreve ainda as mudanças no equilíbrio, assim como o conhecimento da posição, do peso e da resistência dos objetos em relação ao corpo (ANDREWS, HARRELSON e WILK, 2000). O sistema visual, vestibular, a sensibilidade dos membros inferiores e o “sentido muscular” (propriocepção) são sentidos do equilíbrio. A integração dessas informações sensoriais participa do controle do equilíbrio (GAGEY e WEBER, 2000).
Informações de origem somatossensorial, através de proprioceptores musculares, cutâneos e articulares, conjuntamente com informações do sistema visual e do sistema vestibular, oferecem conhecimento da estruturação do corpo no espaço ao sistema nervoso central, proporcionando ações motoras para a manutenção do equilíbrio postural, pela contração dos músculos antigravitacionais (BARCELLOS e IMBIRIBA, 2002).
Coordenação, equilíbrio e habilidades motoras funcionais são interdependentes e são afetados pelos sistemas sensoriais, particularmente os sistemas somatossensorial e proprioceptivo. A coordenação e o equilíbrio precisam estar presentes para que se aprenda e desempenhe habilidades funcionais. Quando há alguma lesão músculo-esquelética e/ou neuromuscular desenvolve-se comprometimentos subseqüentes como perda de força (paresia), imobilidade dos tecidos moles ou perda da resistência física, a coordenação, equilíbrio e habilidades funcionais poderão ser também afetados, levando a incapacidades e deficiências (KISNER e COLBY, 1998). A coordenação neuromuscular desempenha importante papel na manutenção do equilíbrio na posição ereta (ELLENBECKER, 2002).
A informação aferente dos mecanorreceptores é analisada no sistema nervoso central para posição e movimento da articulação, de modo que possam ser avaliados os estados estáticos em comparação com os estados dinâmicos, equilíbrio em comparação com desequilíbrio. Depois de processada e avaliada, essa informação proprioceptiva é capaz de influenciar o tônus muscular, controle motor e percepções cognitivas ou consciência cinestésica (ELLENBECKER, 2002).
A informação proprioceptiva protege a articulação contra lesões causadas pelo movimento que excede a amplitude de movimento fisiológica e normal, e ajuda a determinar o apropriado equilíbrio entre forças sinergistas e antagônicas (ELLENBECKER, 2002).
Os receptores são classificados por localização em: articulares (presente nas articulações), profundos (músculos, tendões e ligamentos) e superficiais (cutâneos). Os receptores articulares estão localizados dentro da cápsula articular, ligamentos e em todas as estruturas intra-articulares existentes no corpo. A cápsula articular contém quatro tipos de receptores distintos de terminações nervosas: Corpúsculos de Ruffini, receptores de Golgi, corpúsculos de Paccini e terminações nervosas livres (ANDREWS, HARRELSON e WILK, 2000).
Os corpúsculos de Ruffini são sensíveis ao alongamento da cápsula articular alteração da pressão do fluido intracapsular, amplitude e velocidade de alteração da posição articular. Os receptores de Golgi são intraligamentares e apresentam-se ativos quando os ligamentos são solicitados nos extremos do movimento articular. Os corpúsculos de Paccini são sensíveis à vibração de alta freqüência, e as terminações nervosas livres são sensíveis ao estresse mecânico (ANDREWS, HARRELSON e WILK, 2000).