Nos
últimos 30 anos, o Brasil reduziu significativamente a desnutrição infantil,
mas o problema coexiste hoje com a obesidade.
Fenômeno recente da insegurança alimentar e nutricional que pode se expressar
na população independentemente de sexo, idade, raça ou classe social.
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam que 15%
das crianças com idade entre 5 e 9 anos têm obesidade. Uma em cada três não
chegou ao nível da obesidade, mas estão
com peso acima do recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pelo
Ministério da Saúde.
Alimentos básicos x
processados
A coordenadora-geral de Alimentação e Nutrição do Ministério da Saúde, Patrícia
Jaime, afirma que a mesma pesquisa mostra que parcela importante das crianças
não consome de forma regular alimentos básicos e naturais, como legumes,
verduras e frutas. "Obviamente isso pode ser explicado por uma mudança no
padrão de consumo da população brasileira que resultou em uma diminuição do
consumo dos alimentos básicos, tradicionais, da dieta brasileira, que
dialogavam com nossa cultura alimentar, de cada região, pela introdução de
alimentos cada vez mais processados, industrializados, modificando não só a qualidade
da dieta do ponto de vista nutricional, mas os comportamentos e os hábitos
alimentares, como comer em casa, comer em família, o comer compartilhado, por
uma substituição por comer em frente à televisão, por comportamentos que não
são saudáveis."
A pesquisa de orçamentos familiares do IBGE mostra que pão, biscoitos, macarrão
e arroz são responsáveis por 35% das calorias consumidas pelo brasileiro em
casa. Refrigerantes e doces somam 13% dos produtos consumidos, acima inclusive
das carnes com 12,6%. Frutas e sucos naturais são só 2% do que é comprado, e
legumes e verduras 0,8%.
Ana Claudia Bessa, mãe de dois filhos, integra o Coletivo Infância Livre de
Consumismo. Ela se preocupa com a alimentação dos filhos e dá preferência a
produtos naturais. Ela reconhece, no entanto, que muitas vezes as informações
acerca dos produtos não são claras, o que pode levar os pais ao erro.
Ingestão de açúcar
"No suco de caixinha está escrito: seu filho cresce saudável e se diverte.
Eu entrei no site do Del Valle e peguei a composição do suco de morango.
Primeiro, o ingrediente que tem mais é água, depois açúcar, ou seja, antes do
suco da fruta tem açúcar, suco de morango, cálcio, reguladores de acidez, aroma
idêntico ao natural, isso é artificial, estabilizantes goma aguar, acetato de
isoburato de sacarose e goma éster e corante natural carmin."
A coordenadora do projeto Genética de Transtornos Alimentares da Universidade
de São Paulo, Sophie Deram, lembra que a OMS recomenda que não passe de 10% a
ingestão de açúcar na dieta diária.
Ela explica que o consumo regular de alimentos e bebidas adoçados pode levar a
um ciclo de dependência química. "Na verdade, atua no mesmo receptor da
recompensa da cocaína. Realmente, no seu cérebro, ele recebe uma recompensa
muito forte com o açúcar e quanto mais açúcar, mais complicado. A criança obesa
não é uma criança preguiçosa, uma criança que só tem gula, que não tem força de
vontade. É uma resposta bioquímica. Vai aumentar o apetite e vai diminuir a
atividade física. Vai se sentir mais cansada e vai querer comer mais. Comendo
mais, ela vai ter risco de entrar em resistência insulínica e ter risco de
diabetes."
O endocrinologista Paulo César Alves da Silva, da Sociedade Brasileira de
Endocrinologia, considera que a obesidade infantil já atingiu índices de
epidemia e alerta que crianças e adolescentes obesos terão mais probabilidade
de continuarem obesos na fase adulta. "O excesso de peso em crianças e
adolescentes causa mais morte que a desnutrição hoje. Os pais precisam que o
médico os estimule a considerar que a obesidade é uma doença e não simplesmente
uma situação estética que a criança esteja com mais peso e a puberdade já é por
si um estado de relativa resistência insulínica, ou seja, comida errada aqui
com o hormônio lipogênico como a insulina é sinal de excesso de peso
caminhando."
Falta de informação
A diretora da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome
Metabólica (Abeso), Maria Edna de Melo, avalia que a falta de informação sobre
a obesidade infantil é o principal problema a ser combatido. "Na prática
quando a gente começa a atender o paciente, começa a conversar com a família,
eles têm muitas ideias erradas. A começar pelo próprio grau de adiposidade das
crianças, porque quando a gente coloca a criança no gráfico lá e diz 'a criança
está obesa', a mãe fica muito brava com a gente e diz que não é verdade. As
ideias erradas com relação à alimentação são o maior problema que a gente tem.
Elas têm várias fontes de revistas, falta uma educação nutricional boa e falta
assistência nutricional."
Maria Edna de Melo elogiou projeto de lei em discussão na Câmara (PL 3874/12)
que cria a Semana de Mobilização Nacional contra a Obesidade Infantil. Em
seminário realizado na Casa, especialistas foram unânimes em afirmar que a
prevenção é a melhor política para atacar o problema.
Fonte : EBC